Viagens & Turismo

O mundo é um livro, e aqueles que não viajam lêem apenas uma página“, já dizia Santo Agostinho no século IV, traduzindo uma das experiências mais enriquecedoras do ser humano. Viajar abre horizontes e permite-nos explorar novos mundos, deslumbrando os cinco sentidos por uma vastidão de paisagens, culturas e tradições. Por tudo isto e muito mais, as viagens, e o turismo, tornaram-se uma das maiores e mais impactantes indústrias globais. Contudo, os impactos que gera não são apenas positivos. Apesar do seu incrível potencial para gerar benefícios económicos, de inclusão e diálogo intercultural, diversidade, respeito, de preservação dos recursos naturais e patrimoniais, e até contribuir para a construção da paz, o setor do turismo está também entre os que mais contribuem para a degradação do planeta e dos seus recursos, nalguns casos gerando desigualdade e pobreza. Neste contexto, a adoção de práticas conscientes, mais responsáveis e sustentáveis, é uma obrigação de todos, viajantes, destinos, empresas e governos, e só juntos podemos transformar cada viagem numa oportunidade para fazer um mundo melhor!

Factos-chaves

O turismo contribui com aproximadamente 34 mil milhões de euros para o PIB (2023), representando 12,7% do Produto Interno Bruto nacional. Este valor reflete o impacto significativo do setor na economia portuguesa, destacando-se como uma das principais atividades económicas do país e uma importante fonte de receitas
O setor do turismo emprega diretamente cerca de 330 mil pessoas, representando 6,6% da população ativa em Portugal. Indiretamente, o turismo emprega 1,11 milhões de pessoas, correspondendo a cerca de 22,4% da população empregada. O setor é crucial para a geração de emprego em áreas como o alojamento, restauração, transporte, comércio e serviços
Em 2023, Portugal recebeu 26,5 milhões de turistas não residentes, representando um crescimento de 19,2% face a 2022. Este crescimento reflete a recuperação e o fortalecimento do setor turístico nacional após a pandemia COVID-19
Em Portugal, as emissões de gases de efeito estufa (GEE) derivadas do turismo foram estimadas em 56,4 milhões de toneladas (CO₂ eq). O setor dos transportes, que inclui o transporte aéreo, terá representado mais de 30% dessas emissões
56,4 milhões de toneladas de GEE derivados do turismo em Portugal! É como se cada português fosse responsável por emitir 5,5 toneladas de CO2 para a atmosfera num único ano. Um contributo considerável para o aquecimento global e para a mudança climática
A atividade turística em Portugal apresenta um desequilíbrio significativo entre diferentes regiões. Em 2023, as regiões de Lisboa, Algarve e Madeira concentraram a larga maioria dos turistas (78%), deixando o interior do país num claro segundo plano
O desequilíbrio na distribuição de turistas contribui para inúmeras desigualdades entre regiões, com o interior do país a ser alvo de menor investimento, coesão e desenvolvimento socioeconómico
As áreas costeiras enfrentam maior pressão ambiental devido ao elevado número de turistas, levando inevitavelmente à degradação dos recursos naturais e culturais, e à delapidação de importantes fatores identitários
A urbanização e construção de infraestruturas turísticas levam à perda de habitats naturais. Estima-se que nas áreas costeiras, cerca 20% dos habitats naturais terão sido destruídos nas últimas décadas devido ao desenvolvimento turístico
O turismo aumenta significativamente o consumo de água nos destinos. Em regiões como o Algarve, atualmente em situação de seca severa, o consumo de água durante a época-alta pode aumentar em 50%

por:
José Nunes

make it Better

Pontos positivos

  • Diversidade Concentrada: Portugal possui uma diversidade impressionante, sendo um exemplo perfeito deste conceito. Em poucas horas de viagem, é possível passar das praias do Algarve para as montanhas do Gerês, ou das vinhas do Douro para as planícies do Alentejo, combinando, em abundância, diferentes expressões da sua cultura, natureza, paisagem, gastronomia e história
  • Turismo sustentável: O Plano Turismo +Sustentável 25-30​ estabelece metas ambiciosas para enfrentar desafios globais e locais, com foco na economia circular, neutralidade carbónica e a transição digital. Por outro lado, Portugal aderiu a iniciativas como o Global Sustainable Tourism Council (GSTC), o Pacto Português para os Plásticos, a Declaração de Gla​sgow para a Ação Climática no Turismo e a Declaração de Cancún do World Travel and Tourism Council (WTTC) sobre Igualdade e Liderança das Mulheres no Turismo, dando sinal positivo e abrindo portas a uma atividade turística mais responsável
  • Hospitalidade: A hospitalidade portuguesa é frequentemente destacada como um dos principais fatores de atração turística. De acordo com o Barómetro do Turismo (IPDT), a segurança, a estabilidade política e a qualidade dos serviços turísticos são elementos que consolidam Portugal como um destino acolhedor e caloroso, melhorando a experiência dos turistas e incentivando o retorno
  • Identidade: A identidade cultural, a genuinidade e autenticidade são fatores cruciais sobre os quais se constrói a imagem do país e das regiões, e a sua capacidade para atrair visitantes, sejam eles nacionais ou internacionais. Estes são os fatores primordiais da indústria turística nacional, determinando as preferências de turistas por todo o mundo, e contribuindo em muitos casos para a preservação destes fatores.
  • Reconhecimento: Portugal tem sido consistentemente reconhecido como um dos melhores destinos turísticos do mundo. Nos World Travel Awards 2023, Portugal foi eleito o Melhor Destino Turístico da Europa. Este reconhecimento, atribuído por profissionais do setor turístico, destaca também a sustentabilidade enquanto critério de avaliação, reconhecendo destinos que demonstram compromisso com práticas sustentáveis, incluindo a gestão ambiental, a preservação cultural e o impacto social positivo

Pontos negativos

  • Sazonalidade: Em Portugal, a atividade turística depende fortemente da época alta, como o verão, levando a flutuações consideráveis da atividade económica, com sérios impactos negativos na estabilidade financeira das empresas e, consequentemente, no emprego. Este tende a ser precário, pouco qualificado e pouco qualificante, produzindo assim efeitos perversos de exclusão económica e de aumento da vulnerabilidade social
  • Capacidade de carga: A concentração de turistas em determinadas épocas e locais resulta numa pressão excessiva sobre os recursos naturais, culturais e sobre os serviços e infraestruturas públicas, afetando negativamente a sua gestão (abastecimento de água, infraestruturas de saneamento, gestão de resíduos, saúde pública, cadeia de distribuição, desigualdade de acesso a bens básicos, etc.), mas sobretudo depreciando a qualidade de vida dos residentes locais e a sustentabilidade dos destinos
  • Gentrificação: O turismo é uma das principais causas da gentrificação, sendo particularmente visível nas grandes cidades e em muitos centros históricos por todo o país. O fenómeno traduz-se no aumento do custo de vida e dos preços imobiliários, favorecendo a ocupação de bairros tradicionalmente habitados por classes populares por classes mais abastadas, e resultando em alterações da paisagem urbana e da dinâmica social, onde se inclui a perda de identidade e de fatores culturais chave para o setor
  • Governança Turística: Ainda que se tenha percorrido um longo e frutuoso caminho em termos de governança turística a nível nacional e regional (feito de norte a sul pelas Entidades Regionais de Turismo) há ainda um longo caminho a percorrer a nível local. Raros são os municípios com DMOs (Destination Management Organisations) criadas para, de forma integrada, inclusiva e participativa (governos locais, empresas e cidadãos), gerir, promover e proteger os seus principais recursos locais e identidade
  • Sensibilização e Capacitação: Embora existam muitas iniciativas nacionais com este propósito, elas são ainda assim dispersas, insuficientes e pouco vinculativas. A capacitação dos profissionais do setor, nem sempre assumida como prioridade por empresas e trabalhadores, é essencial para garantir uma oferta de qualidade, mas sobretudo para garantir a real implementação de práticas turísticas mais responsáveis e sustentáveis. Ações que incluam visitantes e turistas são também uma prioridade

O que podes fazer?

Ações Individuais

Planear a viagem com responsabilidade: Antes de viajar, procure informar-se melhor sobre o destino e sobre os desafios que as comunidades locais enfrentam em matéria de sustentabilidade. Planeie a sua visita em momentos de menor pressão humana, evitando os períodos de maior procura (evite sobrecarregar infraestruturas básicas e recursos escassos para quem aí vive e trabalha). Um destino sustentável só o é se todos, residentes e visitantes, assumirem uma atitude responsável

Respeitar valores e identidade: Procure conhecer a história, os valores, a identidade, as causas e os aspetos culturais das comunidades do destino. Deve conhecer as normas sociais que ali imperam, evitando comportamentos que possam ser mal-entendidos, ofensivos ou humilhantes para os locais. Evite invadir espaços de privacidade e seja, aos olhos de outros visitantes, um exemplo de respeito e tolerância, criando oportunidades de partilha e enriquecimento de valores sociais fundamentais. Não faça aos outros o que não gosta que lhe façam a si

Respeitar o espaço e as infraestruturas: Um bom sítio para viver é, por norma, um bom sítio para visitar. Já o contrário não é necessariamente verdade. Antes de serem destinos turísticos, os locais que visita seriam já habitat de fauna e flora, mas também a “casa” de quem ali habita. Assuma um papel ativo na conservação e proteção dos espaços e equipamentos que usa ou visita, respeitando as suas regras e limites. Evite adulterar o modo de vida local e desgastar recursos frágeis e escassos

Consumo responsável: Antes de adquirir produtos ou serviços turísticos, verifique se são prestados de forma justa e responsável (social e ambientalmente). Certifique-se também que realmente precisa e faça-o por um valor justo. Sempre que possível, opte por produtos e negócios locais únicos em detrimento de outros como cadeias ou produtos padronizados que encontra em qualquer lugar, contribuindo assim para uma distribuição mais equitativa dos benefícios e para melhores condições de vida de pessoas e empresas locais.

Visitante carbono zero: Seja um visitante exemplar. Procure experiências que se pautem por uma gestão eficiente dos recursos, e produtos que possam ser reutilizados ou reciclados. Evite o desperdício de água e utilize, sempre que possível, meios de transporte não poluentes. Adote uma atitude responsável, produzindo menos resíduos e evitando a sua deposição em locais inapropriados. Calcule a sua pegada de carbono e, na medida do possível, compense-a localmente

Ações Coletivas

Contrariar a procura turística: Influenciar familiares e amigos a visitar territórios menos conhecidos, reduzindo a pressão sobre destinos mais populares e massificados e promovendo coesão e um desenvolvimento mais equitativo dos territórios. Viajar, sempre que possível, em épocas onde há menor procura, reduzindo assim a vulnerabilidade social associada à exclusão económica e ao desemprego que dela resulta

Adotar práticas de economia partilhada: A economia partilhada facilita o acesso a experiências autênticas e locais, promovendo um turismo mais responsável e culturalmente enriquecedor, incluindo por exemplo refeições preparadas por residentes ou até visitas guiadas por eles. Dê atenção ao transporte (grande contribuinte para a pegada de carbono do turismo), utilizando preferencialmente meios de transporte coletivo, ou outros meios de transporte partilhado

Responsabilidade social: Realizar campanhas de informação e sensibilização para turistas e agentes turísticos sobre a importância de um turismo mais sustentável e socialmente mais responsável. Estas ações podem incluir a criação e mobilização de pessoas em programas de voluntariado focados na preservação ambiental e cultural nos destinos turísticos, ou o apoio a negócios locais que promovam a inclusão social e a acessibilidade de todos, sem exceção, aos benefícios da atividade turística

Movimentos e Manifestos: Crie ou subscreva iniciativas como “Manifestos” de Turismo responsável e do Visitante Responsável, partilhando-os com colegas, amigos e família. Contribua para movimentos de “contágio positivo” de visitantes e turistas, dando o exemplo e ampliando a escala de uma ação coletiva simples, mas eficaz. Não se esqueça, só existirá uma atividade turística irresponsável social e ambientalmente enquanto para ela existir mercado. Isto só se inverterá quando todos estivermos informados e conscientes do seu impacto

Faça parte da sustentabilidade: A sustentabilidade dos destinos turísticos, e do planeta, implica um esforço e uma mudança coletiva. Junte-se a causas relevantes e apoie as organizações e projetos de base comunitária que se preocupam com o planeta no seu esforço de transição energética, de descarbonização, de sustentabilidade social e ambiental, ou outras que incentivem a paz, o respeito e a tolerância

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